Reposição hormonal na menopausa e câncer. Existe esta associação?

O tratamento de reposição hormonal na menopausa foi associado a um possível aumento do risco de ter câncer de mama. Isso aconteceu após a publicação de resultados parciais do Estudo WHI. Como decorrência, ainda hoje, as mulheres preferem sofrer na menopausa para evitar um mal maior. Para esclarecer melhor, desde o início, os dados do Estudo WHI foram questionados por especialistas da área. Ou seja, eles encontraram enganos estatísticos e distorções , não confirmando o aumento do risco de câncer de mama.

Fazer reposição hormonal na menopausa e câncer: resultados controversos?

Todas as mulheres são únicas e, desse modo, experimentam a menopausa de maneiras diferentes.

Entretanto, em 2002, antes do prazo estipulado, um ramo do estudo foi encerrado. Tal fato foi justificado tendo por base dados que apontariam o aumento do risco de câncer de mama num grupo de usuárias de reposição hormonal. Jornais, revistas, emissoras de rádio e TV divulgaram a notícia com grande alarde, apesar dos resultados serem iniciais e do estudo ainda não ter sido encerrado. Em função da estrondosa divulgação e, também, da dificuldade de compreensão de um assunto de alta complexidade como esse, muitos mal-entendidos aconteceram. Desse modo, as informações que acabaram sendo assimiladas pela população foram as de que todos os tipos de hormônios usados para tratar a Menopausa poderiam aumentar o risco de câncer de mama. O medo se espalhou! Assim, o uso dos hormônios da Menopausa foi sendo abandonado.

Força-tarefa

Recentemente, uma verdadeira força-tarefa de especialistas em Menopausa foi montada com o objetivo de reanalisar o WHI. Assim sendo, sob a coordenação da Dra. JoAnn Manson, do Brigham and Women’s Hospital – Harvard Medical School de Boston, nos Estados Unidos, a equipe revisou tudo o que já havia sido publicado sobre o WHI e chegou a conclusões tranquilizadoras.

Sintomas da menopausa e terapia de reposição hormonal: breve histórico

Os calores e suores tipicamente associados à menopausa representariam um mínimo diante do que a falta dos hormônios ovarianos provocaria no organismo feminino.

O início da reposição hormonal

A possibilidade de aliviar os sintomas da Menopausa foi o que motivou a pesquisa hormonal. Em função disso, desde os anos 1900, os laboratórios farmacêuticos vinham investindo grandes somas de dinheiro na pesquisa de hormônios.

A partir da década de 1930, os hormônios começaram a ser encontrados. Em decorrência, as mulheres tiveram acesso a tratamentos hormonais com ótimos resultados.

O sucesso da terapia de reposição para sintomas na menopausa

O sucesso foi enorme e sua utilização se espalhou pelo mundo. Deste modo, por ser algo novo, a comunidade médica sentiu necessidade de mais estudos. As pesquisas publicadas na época já haviam mostrado os benefícios dos hormônios.

Reposição hormonal na menopausa e câncer de endométrio

Desde o início do emprego dos hormônios, uma longa jornada já havia sido trilhada e muito havia sido aprendido. Ou seja, a experiência dos médicos e os estudos observacionais de pacientes que faziam reposição hormonal haviam demonstrado poucos riscos, desde que alguns cuidados fossem observados.

A necessidade de proteger o útero

Um importante aprendizado surgiu das experiências iniciais com a reposição usando apenas um tipo de hormônio. Em decorrência disso, ocorreu um aumento na incidência de câncer de endométrio. Entretanto, ao longo do tempo, foi constatada a necessidade de se proteger o útero com um segundo hormônio.

A prevenção do câncer de endométrio

Assim sendo, através da experiência clínica e estudos da época, foi possível melhorar o tratamento. Como resultado, padronizou-se que, para as mulheres que tinham o útero, a reposição deveria conter, além dos estrogênios, um segundo hormônio [uma progestina]. Ou seja, este esquema hormonal faria, também, a proteção do endométrio. [ Endométrio: camada de revestimento interno do útero]. Consequentemente, a ausência desta progestina no esquema de reposição hormonal da Menopausa, aumentaria as chances da mulher vir a ter um câncer de útero [endométrio].

Terapia de reposição para os sintomas da menopausa: necessidade de mais pesquisas

Resolvida a questão do aumento do risco de câncer de endométrio, ainda persistiam dúvidas a respeito do tratamento da Menopausa.

Por exemplo...
Haveria chance da reposição aumentar o risco de câncer de mama ou outros tipos de câncer?
Seria a reposição hormonal na Menopausa útil na prevenção de doenças do envelhecimento?
Poderiam os hormônios prevenir e retardar demências, problemas cardíacos e outros?

Com o intuito de responder a estas perguntas, em 1995, foi iniciado um estudo considerado especial nos Estados Unidos: o estudo WHI.

Estudo WHI

O diferencial do estudo se daria em função do grande número de participantes e da possibilidade de comparar grupos de pacientes que faziam reposição hormonal com grupos que não faziam. Além do mais, o acompanhamento destes grupos seria realizado durante muitos anos.

Pela primeira vez, em toda a história da Medicina, questões sobre a saúde feminina receberam tanto dinheiro para pesquisa como no Estudo WHI.

O Estudo WHI avaliaria a reposição hormonal da Menopausa

O estudo WOMEN’S HEALTH INITIATIVE – WHI, foi desenvolvido com o objetivo de analisar se a reposição dos hormônios usados para tratar os sintomas da menopausa também poderia ser usada para prevenir doenças crônicas.

O foco principal estaria na ação destes hormônios e sua eficácia na doença cardíaca coronária (DCC) e em relação à segurança de seu uso quanto ao câncer de mama invasivo. Ainda avaliaram riscos p/ acidente vascular cerebral, embolia pulmonar, câncer colo retal, câncer endometrial, fratura de quadril e mortes.

As mulheres que participaram do estudo estavam em Menopausa, há anos, e tinham maior chance de ter algum tipo de doença cardiovascular ou metabólica em função da idade mais avançada.

Como o Estudo WHI foi estruturado

As mulheres participantes do estudo, cadastradas entre os anos de 1993 e 1998, vieram de 40 centros médicos de diferentes estados americanos.

  • Participaram no total 27.347 mulheres na Pós-menopausa
  • A idade das participantes variou entre 50 e 79 anos no início do estudo
  • A idade média das mulheres era de 64 anos no início da pesquisa
  • Os hormônios testados eram os mais usados na época: Conjugado de Estrógenos Equinos [CEE] e Medroxiprogesterona [MPA].
  • Os esquemas testados eram os mais prescritos para a terapia de reposição hormonal [TRH]:
    • um estrogênio usado isoladamente [quando a mulher havia retirado o útero]
    • um estrogênio associado a uma progestina [quando a mulher tinha útero].
Esclarecendo termos e siglas:   
* CEE: Conjugado de Estrógenos Equinos
* MPA: Medroxiprogesterona
* TRH: Terapia de Reposição Hormonal
* WHI: WOMEN’S HEALTH INITIATIVE

Número de anos que as participantes já estavam na Menopausa quando o estudo começou

Mulheres que participaram do estudo
WHI já estavam na Menopausa
CEE+MPACEE
Na Menopausa há menos de 10 anos 36,2%18,4 %
Na Menopausa entre 10 e 20 anos39,7 %32,0 %
Na Menopausa há mais de 20 anos24,1 %49,6 %

O estudo foi dividido em 2 grandes braços.

Estudo WHI-Braço 1: testou hormônios CEE + MPA
Estudo WHI-Braço 2: testou hormônio CEE

Braço 1 – mulheres que ainda tinham útero

Três mulheres de meia-idade caminham à beira-mar.

40% das mulheres já estava na Pós-menopausa há quase 20 anos. 

Este ramo do WHI, o Braço 1, estudou mulheres que estavam na Pós-menopausa e mantinham seu útero [não haviam feito histerectomia]. Elas usaram o esquema de reposição hormonal composto pelo hormônio Conjugado de Estrógenos Equinos [CEE] associado ao hormônio que deveria proteger o útero-Medroxiprogesterona [MPA].

Idade que as mulheres do Braço 1 tinham no começo do WHI

Idade no início
do estudo  
% das mulheres
por faixa idade
50-59 anos 33,4 %
60-69 anos 45,3 %
70-79 anos 21,3 %

Este braço do estudo acabou sendo suspenso após 5,6 anos, antes do prazo previsto de 10 anos.

Isso ocorreu porque os pesquisadores teriam percebido um aumento do risco de câncer de mama nas mulheres que estavam usando estes hormônios.

Encerramento Braço 1: 07/07/2002- associação de hormônios [CEE + MPA]

Braço 2 – mulheres que não tinham mais útero

50% das mulheres já estava na Pós-menopausa há mais de 20 anos  
Três mulheres sorridentes não tem sintomas da menopausa.
Mulheres na Pós-menopausa, que fizeram o tratamento da Menopausa com hormônios, referiram um aumento da qualidade de vida. Os sintomas da Menopausa quase desapareceram.

O Braço 2, estudou mulheres que estavam na Pós-menopausa e que não tinham mais o útero. Elas tinham feito cirurgia para retirar útero+trompas ou útero+trompas+ovários. Assim, não precisariam usar o hormônio para a proteção do útero. Estas usariam, apenas, o hormônio Conjugado de Estrógenos Equinos [CEE] .

Idade que as mulheres do Braço 2 tinham no começo do WHI

Idade no início
do estudo
% das mulheres
por faixa de idade
50-59 anos 30,9 %
60-69 anos 44,9 %
70-79 anos 24,2 %

Encerramento Braço 2: 29/02/2004- CEE

O braço 2 do estudo WHI foi interrompido após 7,2 anos, em função de dados preocupantes encontrados. Ou seja, dentre as inúmeras análises realizadas no estudo, destacou-se um aumento do risco destas mulheres apresentarem derrames (AVCs).

O encerramento global do Estudo WHI

30/09/2010 – Concluída a fase de acompanhamento posterior ao uso dos hormônios.

O estudo WHI impactou intensamente o tratamento da menopausa. Ou seja, antes da publicação do WHI, quase 40% das mulheres na menopausa fazia reposição. Em contraste, após a publicação de 2002, apenas 5% continuou a fazer o tratamento de reposição.

Tratamento da menopausa e câncer de mama: associação não comprovada

Alguns dados divulgados foram interpretados, erroneamente, pela população na época. Por isso, a ideia que ficou, foi a de que todos os tipos de hormônios aumentariam o risco de ter câncer de mama e outras doenças.

Entretanto, na realidade, tudo o que foi citado no estudo WHI diz respeito a, apenas, dois hormônios: Medroxiprogesterona e Conjugado de Estrógenos Equinos.

Reposição hormonal da menopausa e câncer: conclusão

Os resultados finais do WHI não confirmaram a associação ao câncer de mama. Pelo contrário, quando as mulheres eram mais jovens e recém haviam entrado em Menopausa, o risco para o câncer de mama diminuiu.

A seguir…

Nos próximos posts, vamos reavaliar os resultados do estudo, mostrar como o estudo é avaliado na atualidade, quais limitações geraram os resultados deturpados que mostravam aumento das doenças cardiovasculares e do risco de câncer de mama.

*** Fonte: Menopausal Hormone Therapy and Health Outcomes During the Intervention and Extended Poststopping Phases of the WHI Randomized Trials In

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